Page 753 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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Quem  gritou  foi  Passofirme,  que  disparou  ruidosamente  a  galope
                  rumo  ao  Ocidente.  E  embora  ninguém  o  tivesse  entendido,  foi  como  se
                  aquelas palavras fizessem tilintar tudo à volta deles. Ao escutá-las, o javali
                  grunhiu alegremente. O urso já ia abrindo a boca para dizer que ainda não
                  estava  compreendendo  nada,  quando  seus  olhos  bateram  nas  árvores
                  frutíferas  bem  atrás  deles.  Saiu  gingando  para  o  pomar  o  mais  depressa
                  possível e lá, com certeza, encontrou algo de que ele entendia muito bem.
                  Os  cães,  porém,  continuaram  ali,  abanando  as  caudas,  como  também
                  Poggin, que cumprimentava todo mundo com um enorme sorriso no rosto
                  bondoso. Precioso recostou a cabeça alva como a neve no ombro do rei,
                  que  lhe  cochichou  alguma  coisa  ao  ouvido.  Então  todos  voltaram
                  novamente para a Porta, para ver o que se passava do lado de lá.

                         Agora  os  dragões  e  os  lagartos  gigantes  haviam  se  apoderado  de
                  Nárnia. Iam de um lado para outro, arrancando as árvores pelas raízes e
                  devorando-as  como  se  fossem  moitas  de  capim.  Em  poucos  minutos  as
                  florestas  haviam  desaparecido.  A  terra  inteira  ficou  completamente
                  exposta,  deixando  à  mostra  cada  elevação,  cada  concavidade,  cada
                  buraquinho,  na  forma  mais  nua  e  grotesca  que  se  poderia  imaginar.  A
                  grama secou. Tirian viu-se contemplando um mundo de rochas despidas e
                  terra vazia. Mal se poderia acreditar que algum dia já existira vida ali. Os
                  próprios  monstros  começaram  a  envelhecer  e  cair  ao  chão,  mortos.  Sua
                  carne  secou  e  os  ossos  apareceram.  Logo  não  passavam  de  gigantescos
                  esqueletos  atirados  aqui  e  acolá  sobre  pedras  mortas,  como  se  tivessem
                  morrido  há  milhares  de  anos.  Durante  um  longo  tempo  tudo  ficou  em
                  silêncio.

                         Finalmente,  alguma  coisa  branca  –  uma  longa  linha  plana  de
                  brancura,  que  brilhava  à  luz  das  estrelas  que  ali  estavam  –  começou  a
                  mover-se na direção deles, vindo do fim do mundo, do lado do Oriente. Um
                  estranho ruído quebrou o silêncio: a princípio era um murmúrio, depois um
                  trovejar distante e, por fim, um grande estardalhaço. E então eles viram que
                  aquilo que se aproximava com tanta rapidez era uma coluna espumejante
                  de  água.  O  mar  estava  inundando  a  terra.  Naquele  mundo  despido  de
                  árvores dava para ver  muito bem. Todos os rios foram ficando cada vez
                  mais largos e os lagos tornando-se maiores; os lagos separados juntaram-se
                  num  só,  os  vales  transformaram-se  em  novos  lagos,  os  montes  viraram
                  ilhas  e  estas  também  finalmente  desapareceram.  Os  altos  pântanos  à
                  esquerda deles e as montanhas mais altas, à direita, desintegraram-se com
                  um barulho ensurdecedor no meio da água que se avolumava. A água veio
                  jorrando  aos  borbotões  até  bem  pertinho  da  entrada  da  Porta  (mas  sem
                  nunca ultrapassá-la), tão perto que espirrava espuma nas patas dianteiras de
                  Aslam.  Agora,  tudo  era  uma  só  extensão  de  água,  desde  onde  eles  se
                  encontravam até o ponto onde a água encontrava o céu.
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