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MARXISMO E A QUESTÃO NACIONAL (...)  | PAUTASSO - FERNANDES - DORIA


               suposto de que “a emancipação dos trabalhadores não é um problema
               local ou nacional, mas internacional”. E, dado isso, concluiu-se que a
               Internacional Comunista seria o representante unitário do movimento
               comunista em todo o mundo, sendo os partidos de cada país nada mais
               do que suas seções (LOSURDO, 2015a, p. 192). Na Terceira Internacio-
               nal, está a ideia de que a revolução socialista é consequência de uma
               única contradição que se contrapõe na esfera mundial, da burguesia e
               proletariado; e por isso a necessidade de um “partido bolchevique mun-
               dial”. A superação dessa concepção tem como resultado inescapável a
               dissolução da Terceira Internacional determinada por Stálin em 1943.
                     Evidentemente, a trajetória histórica revela uma práxis mais com-
               plexa. Stálin, cuja experiência prévia incluiu a chefia do Comissariado
               das Nacionalidades, teve de lidar com particularismos e imperativos de
               unidade nacional. Além disso, ressalte-se o colaboracionismo de algu-
               mas nacionalidades com o nazismo durante a Segunda Guerra, como
               alemães do Volga, chechenos, tártaros da Crimeia, inguches , entre ou-
                                                                       12
               tras (SEGRILLO, 2000, p. 164). Sem os desafios da práxis, não se enten-
               de que, ao invés de levar à autodissolução do Estado, a experiência so-
               viética fortaleceu seu aparelho político-coercitivo, de modo a lidar com o
               não previsto imperativo de desenvolvimento acelerado e de guerra com
               expressivo grau de especialização (MORAES, 2007, p. 123). Aliás, como
               bem destaca Fernandes (2000), não é possível entender a autonomiza-
               ção do Estado sem compreender as imposições do atraso (cerco militar,
               população camponesa desarticulada, subdesenvolvimento) e as contra-
               dições próprias à experiência socialista (relação abundância-escassez e
               convívio no sistema internacional capitalista).
                     A questão nacional aparece novamente na análise sobre os proble-
               mas ocorridos na URSS após a ascensão de Kruschev ao poder em 1953
               (LOSURDO, 2004). A política de unidade nacional levada a cabo pelos
               bolcheviques durante a luta contra o nazismo foi desfeita em compasso
               com a demonização de Stálin a partir de um frágil Relatório Secreto.

               12  Inguches é o povo da República da Ingushetia, unidade federativa da Rússia, capital Magas, cuja população tem
               aspirações separatistas.

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