Page 18 - O Poderoso Chefao - Mario Puzo_Neat
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tom baixo.
Eles ouviram as pisadas de Hagen afastando-se. Sonny esperou alguns momentos, deu um
beijo forte nos lábios de Lucy, e depois saiu sorrateira mente pela porta, indo atrás de Hagen.
Lucy penteou o cabelo. Examinou o vestido e puxou as ligas para cima. O seu corpo sentia-
se machucado, os seus lábios carnudos e suculentos. Ela saiu pela porta e, embora sentisse a
umidade pegajosa entre as coxas, não foi ao banheiro lavar-se, mas desceu correndo a escada e
encaminhou-se para o jardim. Tomou o seu assento na mesa da noiva perto de Confie, que
exclamou petulantemente
— Lucy, onde estava você? Você parece bêbada. Fique ao meu lado.
O noivo louro serviu um copo de vinho a Lucy e sorriu conscientemente. Lucy não se
importava. Ergueu o suco vermelho-escuro de uva até a sua boca ressecada e bebeu. Ela sentia a
umidade pegajosa entre as pernas. Seu corpo tremia. Por cima da borda do copo, enquanto ela
bebia, seus olhos procuravam avidamente Sonny Corleone. Não havia nenhuma outra pessoa que
lhe interessasse ver. Maliciosamente, ela sussurrou no ouvido de Connie.
— Algumas horas mais e você saberá tudo a respeito.
Connie deu uma risadinha. Lucy recatadamente cruzou as mãos sobre a mesa, perfidamente
triunfante, como se tivesse roubado um tesouro da noiva.
Amerigo Bonasera seguiu Hagen até a sala do canto da casa e encontrou Don Corleone
sentado atrás de uma enorme escrivaninha. Sonny Corleone estava postado junto à janela,
olhando para o jardim. Pela primeira vez nessa tarde, Don Corleone portava-se friamente. Não
abraçou o visitante nem apertou-lhe a mão. O pálido agente funerário devia o seu convite ao fato
de que a sua esposa e a esposa de Don Corleone eram amigas íntimas. O próprio Amerigo
Bonasera gozava de completa antipatia por parte de Don Corleone.
Bonasera começou o seu pedido de modo indireto e habilidoso.
— O senhor deve desculpar minha filha, a afilhada de sua mulher, por não ter prestado à sua
família o respeito de comparecer hoje aqui. Ela ainda está no hospital.
Lançou um olhar para Sonny Corleone e Tom Hagen para indicar que não desejava falar na
frente deles. Mas Don Corleone foi impiedoso.
— Todos nós sabemos da infelicidade de sua filha — disse. Se posso ajudá-la de algum
modo, você precisa apenas falar. Minha mulher, afinal de contas, é madrinha dela. Nunca
esqueci essa honra.
Isso era como que uma repreensão. O agente funerário jamais chamara Don Corleone de
“Padrinho”, como mandava o costume.
Bonasera, lívido, perguntou, agora diretamente:
— Posso falar com o senhor a sós?
Don Corleone balançou negativamente a cabeça.
— Confio imensamente nesses dois homens. São meus dois braços direi tos. Não posso
insultá-los mandando-os embora.
O agente funerário fechou os olhos por um momento e depois começou a falar. A sua voz
era serena, voz que ele usava para consolar os desolados.
— Eduquei minha filha à moda americana. Acredito na América. A América fez a minha
fortuna. Dei liberdade à minha filha, contudo lhe ensinei a nunca desonrar sua família. Ela
arranjou um “namorado”, não-italiano. Foi ao cinema com ele. Ficava na rua até tarde. Ele veio
conhecer os pais dela. Aceitei tudo isso sem um protesto, a culpa é minha. Há coisa de dois
meses, foi passear de carro com ela. Tinha um amigo em sua companhia. Fizeram-na beber
uísque e depois tentaram aproveitar-se dela. Minha filha resistiu. Defendeu sua honra. Eles
bateram nela. Como um animal. Quando cheguei ao hospital, ela tinha dois olhos pretos. O nariz
quebrado. O queixo arrebentado. Tiveram de costurá-la com fio metálico. Ela chorava através
de sua dor. “Meu pai, meu pai, por que fizeram isso? Por que fizeram isso comigo?” E eu chorei.
Bonasera não pôde falar mais, estava chorando agora, embora sua voz não traísse sua