Page 22 - O Poderoso Chefao - Mario Puzo_Neat
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garganta para cantar outra melodia.
Todos estavam orgulhosos dele. Johnny era um deles e se tornara um cantor famoso, um
astro de cinema que dormia com as mulheres mais desejadas do mundo. Contudo, mostrara o
devido respeito pelo Padrinho, viajando quase 5.000 quilômetros para comparecer a esse
casamento. Ele ainda amava velhos amigos como Nino Valenti. Muitas das pessoas ali presentes
haviam visto Johnny e Nino cantar juntos, quando eram meninos, e ninguém sonhava que Johnny
Fontane crescesse para ter em suas mãos o coração de cinqüenta milhões de mulheres.
Johnny Fontane esticou os braços e alcançou a noiva, levantando-a para o coreto, de forma
que Connie ficou entre ele e Nino. Os dois homens se agachavam, um de frente para o outro.
Nino tocando o bandolim e tirando uns acordes ásperos. Era um velho costume deles, uma
batalha simulada e um galanteio, usando as vozes como espadas, cada um gritando um coro por
sua vez. Com a mais delicada cortesia, Johnny deixou a voz de Nino superar a sua, deixou Nino
tirar-lhe a noiva do braço, deixou Nino vibrar com a última estrofe vitoriosa enquanto a sua
própria voz morria. Todos os convidados soltaram gritos de aplauso; os três se abraçaram
mutuamente no fim. Os convidados pediram outra canção.
Só Don Corleone, postado na entrada do canto da casa, sentiu qualquer coisa errada.
Entusiasticamente, com um bom humor franco, cauteloso para não ofender os convidados, ele
gritou:
— Meu afilhado viajou quase 5.000 quilômetros para nos prestar essa honra e ninguém pensa
em molhar sua garganta?
Imediatamente, uma dúzia de cálices de vinho foram postos diante Johnny Fontane. Ele
tomou um gole de todos eles e correu para abraçar o Padrinho. Ao fazer isso, murmurou alguma
coisa no ouvido de Don Corleone. Este levou-o para dentro da casa.
Tom Hagen estendeu a mão, quando Johnny entrou na sala. Johnny apertou-a, perguntando:
— Como vai você, Tom?
Sem o seu encanto habitual, que consistia numa autêntica cordialidade para com as pessoas.
Hagen sentiu-se um tanto magoado pela sua frieza, mas deu de ombros. Isso era uma das
inconveniências por ser o homem de confiança de Don Corleone.
Johnny Fontane disse a Don Corleone:
— Quando recebi o convite de casamento eu disse para mim mesmo: “Meu Padrinho não é
mais louco por mim.” Eu lhe telefonei cinco vezes depois do meu divórcio e Tom sempre me
dizia que você estava fora ou ocupado; assim eu sabia que você estava aborrecido.
Don Corleone enchia os cálices com o líquido da garrafa de strega.
— Tudo está esquecido. Agora, posso ainda fazer algo por você? Não será você tão famoso,
tão rico, que eu não possa ajudá-lo mais?
Johnny engoliu o líquido amarelo ardente e estendeu o cálice para ser enchido novamente.
Ele procurava parecer jovial.
— Não sou rico, Padrinho. Estou em decadência. Você tinha razão. Eu nunca devia ter
deixado minha mulher e filhas por essa vagabunda com quem casei. Não o culpo por ter ficado
aborrecido comigo.
Don Corleone deu de ombros.
— Eu me preocupo com você, você é meu afilhado, é só isso.
Johnny andava de um lado para o outro da sala.
— Eu estava louco por essa cadela. A maior estrela de Hollywood. Parece um anjo. E você
sabe o que ela faz depois de um filme? Se o maquilador executa um bom trabalho em seu rosto,
ela trepa com ele. Se o cinegrafista consegue dar-lhe uma aparência extremamente boa, ela o
leva para o camarim e dá uma metida com ele. Todo mundo. Ela usa o corpo como eu uso o
dinheiro trocado de meu bolso para dar gorjeta. Uma prostituta feita de encomenda para o diabo.
— Como vai sua família? — interrompeu Don Corleone bruscamente.
Johnny suspirou.