Page 262 - O Poderoso Chefao - Mario Puzo_Neat
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estavam sempre nervosos, receando que o resto da Família a culpasse por ter indiretamente
causado a morte de Sonny. Ou culpasse o marido dela, Carlo. Mas não era esse o caso. A prova
era que deram a Connie e Carlo uma casa na própria alameda e promoveram Carlo a uma
função importante na organização dos sindicatos trabalhistas. E Carlo se corrigira, parara de
beber, parara de andar com prostitutas, parara de querer bancar o espertinho. A Família se sentia
satisfeita com o trabalho e a atitude dele durante os últimos dois anos. Ninguém o culpava pelo
que tinha acontecido.
— Então, por que você não os convida para vir aqui uma noite e tranqüiliza a sua irmã? —
perguntou Kay a Michael. — A pobrezinha anda sempre tão nervosa a respeito do que você
pensa do marido dela. Diga a ela. E diga também para tirar da cabeça essas preocupações bobas.
— Não posso fazer isso — respondeu ele. — Não falamos nessas coisas na nossa família.
— Você quer que eu diga a ela o que você acaba de me contar? — perguntou Kay.
Ela ficou embaraçada porque Michael levou um tempo enorme pensando numa sugestão
que era obviamente a coisa apropriada a ser feita. Finalmente, ele respondeu:
— Acho que você não deve fazer isso, Kay. Acho que isso não adiantará nada. Ela ficará
preocupada, de qualquer modo. É uma coisa pela qual ninguém pode fazer nada.
Kay ficou espantada. Ela percebera que Michael era sempre um pouco mais frio para a sua
irmã Connie do que para qualquer outra pessoa, apesar da afeição demonstrada por Connie.
— Certamente você não culpa Connie pelo assassinato de Sonny, não é verdade? —
perguntou ela.
— Naturalmente não — respondeu ele. — Ela é minha irmã caçula e eu gosto muito dela.
Tenho pena dela. Carlo se corrigiu, mas continua a ser o tipo do marido errado. É uma dessas
coisas. Vamos esquecer o assunto.
Não era da natureza de Kay insistir num tema desagradável; deu o assunto por encerrado.
Também ela aprendera que Michael não era um homem fácil de se convencer, que ele poderia
se tornar frio e irritado. Ela sabia que era a única pessoa no mundo que podia dobrar a vontade
dele, mas sabia também que fazer isso freqüentemente seria destruir esse poder. E viver com ele
aqueles dois últimos anos fizera-a amá-lo ainda mais.
Kay amava o marido porque ele era sempre cordato. Uma coisa rara. Mas era sempre
cordato com todas as pessoas que o cercavam, nunca era arbitrário nem nas menores coisas. Ela
observara que ele agora era um homem muito poderoso, pessoas vinham à sua casa
conferenciar com ele e pedir favores, tratando-o com deferência e respeito, mas uma coisa o
elevara no conceito dela mais do que tudo.
Desde que Michael regressara da Sicília com a cara quebrada, todo mundo na Família
procurara fazê-lo submeter-se à cirurgia corretiva. A Sra. Corleone dava em cima dele
constantemente; num jantar de domingo, quando todos os Corleone estavam reunidos na
alameda, ela gritou para Michael:
— Você parece um gangster do cinema, mande consertar a sua cara pelo amor de Jesus
Cristo e de sua pobre mulher. E assim o seu nariz deixará de correr como acontece com um
irlandês bêbedo.
O Don, sentado na cabeceira da mesa, observando tudo, perguntou a Kay:
— Isso a incomoda?
Kay balançou a cabeça. O Don falou para a sua mulher.
— Ele não está mais sob o seu domínio, isso não lhe diz respeito.
A Sra. Corleone imediatamente se calou. Não que tivesse medo do marido, mas porque seria
realmente desrespeitoso discutir tal assunto perante os outros.
Mas Connie, a preferida do Don, veio da cozinha, onde estivera preparando o jantar de
domingo, com o rosto vermelho do fogão, e disse:
— Acho que ele deve consertar a cara. Ele era o mais bonito da família antes de sofrer
aquilo. Vamos, Mike, diga que você vai consertá-la.