Page 176 - TUTELA DE URGÊNCIA E TUTELA DA EVIDÊNCIA, Luiz Guilherme Marinoni, Ed. RT, 2017
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do fato não contestado. O réu pode ser tentado a contestar expressamente o fato constitutivo
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implicitamente admitido na sua defesa indireta. Neste caso, porém, o réu deveria deixar de apresentar
defesa direta, hipótese em que a presunção de veracidade decorreria, antes de tudo, da própria
admissão implícita do fato constitutivo na defesa indireta.
O dever de veracidade e o dever de o réu se manifestar precisamente sobre os fatos narrados na
petição inicial impedem que o réu aceite o fato constitutivo na defesa indireta e o negue através de
defesa direta, bem como eliminam a necessidade de o juiz considerar fatos que poderiam ser
contestados apenas por abuso, o que torna racional a prestação jurisdicional.
Por isso mesmo, como antes adiantado, caso o réu aceite o fato constitutivo na defesa indireta e
conteste-o na defesa direta, o juiz, considerando o dever de a parte expor os fatos conforme a verdade,
deve determinar o esclarecimento da defesa, até porque o dever de esclarecimento nada mais é do que
um desdobramento do dever de veracidade. A partir daí, conforme dito no item anterior, caberá a
concessão da tutela da evidência.
3. Tutela da Evidência Baseada na Técnica da Prova dos Fatos Constitutivos
3.1. A Prova Documental dos Fatos Constitutivos
Lembre-se, antes de tudo, que o objeto da prova são as afirmações de fato e não os fatos em si. O
fato não pode ser qualificado de “certo”, “induvidoso” ou “verdadeiro”; ele apenas existe ou não existe.
Como o direito existe independente do processo, esse serve para declarar que o direito afirmado existe.
Isto é, prova-se a afirmação de fato para que se declare que o direito afirmado existe. A sentença de
cognição exauriente limita-se a declarar a verdade de um enunciado, ou melhor, que a afirmação de
que o direito existe é, de acordo com as provas produzidas e o juízo de compreensão do juiz,
verdadeira. Em outras palavras, o direito que o processo afirma existir pode, no plano substancial, não
existir e vice-versa. Não se prova que o direito existe, mas sim que a afirmação de que o direito existe é
verdadeira, declarando-se a existência do direito (coisa julgada material).
Como a tutela da evidência se funda na incontrovérsia ou na evidência dos fatos constitutivos,
antes de mais nada é necessário precisar o conceito de prova documental. Ressalte-se que a prova
pericial ou a prova testemunhal realizada mediante o procedimento da “produção antecipada da
prova” (art. 381, CPC), não raramente confundidas com a prova documental, constituem apenas provas
pericial ou testemunhal “documentadas”. Na realidade, o chamado “documento” que, por exemplo,
contém a declaração testemunhal feita antecipadamente, prova apenas a declaração testemunhal e
não a afirmação de fato que tal declaração pretende provar. A prova testemunhal antecipada permite
a dedução da veracidade da afirmação do fato a partir da declaração testemunhal, constituindo fonte
secundária de prova.
O testemunho é ato humano que serve para demonstrar uma afirmação de fato, enquanto o
(verdadeiro) documento é uma coisa (embora também produto da atividade humana) capaz de
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representar um fato. O testemunho, como ato humano, não demonstra, por si só, um fato, enquanto o
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documento, que é uma coisa, é suficiente para representá-lo.
É importante advertir, no que diz respeito ao documento particular, quer seja escrito e assinado ou
somente assinado, que as declarações dele constantes presumem-se verdadeiras em relação ao
signatário (art. 408, CPC). Se o documento contiver declaração de ciência de determinado fato, o
documento particular prova a ciência, mas não o fato declarado, incumbindo ao interessado em sua
veracidade o ônus de prová-lo (art. 408, parágrafo único, CPC). A declaração de ciência, como é óbvio,
não prova o fato em si. Prova apenas que alguém tem conhecimento de como o fato se passou. Por isto,