Page 178 - TUTELA DE URGÊNCIA E TUTELA DA EVIDÊNCIA, Luiz Guilherme Marinoni, Ed. RT, 2017
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obrigação de fazer e de não fazer – de acordo com o art. 700 do Código de Processo Civil brasileiro.
Pode ser considerado prova escrita porque, embora não reconhecido – nem mesmo tacitamente –, é
merecedor de fé. Ora, se conforme o enunciado id quod plerumque accidit as assinaturas são genuínas,
o juiz também deve considerar autêntica, de acordo com a experiência comum, a assinatura do
documento não reconhecido em relação ao qual, dada a falta do contraditório, ainda não pôde operar
a regra do reconhecimento tácito. 57
No caso de apresentação de embargos à ação monitória, contestando o embargante a autenticidade
da assinatura, o processo deverá caminhar de acordo com a regra probatória do art. 429, II, do Código
de Processo Civil, recaindo sobre o embargado o ônus da prova. Nesta hipótese, como é óbvio, o
documento particular não reconhecido pelo embargante não é prova suficiente para a improcedência
dos embargos. Como explica Garbagnati, “a parte credora tem o ônus de pedir a ‘verificação’ judicial do
escrito privado, colocado como fundamento do decreto injuntivo e desconhecido pelo réu; com efeito,
se o pretenso credor não prova o fato constitutivo do seu direito, a oposição deve ser acolhida, porque
em um processo de conhecimento comum o juiz não tem o poder de fundar a sua decisão em um
escrito privado desconhecido, cuja autenticidade não tenha sido, em seguida ao ato de
desconhecimento, formalmente ‘verificada’ de acordo com a lei.” 58
A hipótese do documento particular não reconhecido bem demonstra a diferença entre prova
escrita, prova suficiente para a tutela da evidência (no procedimento monitório ou no procedimento
comum) e prova suficiente para a procedência do pedido no procedimento comum ou para a
improcedência dos embargos à ação monitória.
A tutela da evidência com base em prova do fato constitutivo e em defesa infundada somente é
possível, como é óbvio, após a ouvida do réu. Se o autor pretender provar o seu crédito mediante
documento particular e o réu alegar a sua falsidade na contestação, não é possível a tutela da
evidência.
É ainda interessante outro exemplo. De acordo com o art. 2.710 do Código Civil italiano, os livros
obrigatórios e outras escrituras contábeis, regularmente mantidos, somente podem constituir prova a
favor de um empresário contra outro e nas relações inerentes ao exercício da empresa. Apesar da
dicção do art. 2.710 do Código Civil italiano, o art. 634 do Código de Processo Civil considera prova
escrita os extratos autênticos das escrituras contábeis, ainda que a “ação monitória” seja proposta por
um empresário – que exerce uma atividade comercial – contra uma pessoa que não seja comerciante. 59
A doutrina que admite que os extratos autênticos das escrituras contábeis podem constituir prova
escrita em uma demanda proposta por um comerciante contra uma pessoa que não exerce atividade
comercial, seguramente não pode admitir que esta prova é suficiente para a tutela da evidência (no
procedimento monitório ou no procedimento comum) e, por muito mais razão, para a procedência do
pedido no procedimento comum ou para a improcedência dos embargos na ação monitória.
Se o devedor não comerciante afirma que não adquiriu a mercadoria cujo preço está sendo exigido
com base em um extrato autêntico de escritura contábil, descabe a tutela da evidência – ou a
antecipação da execução – por ausência de prova do fato constitutivo. Ora, o extrato contábil não é
suficiente para provar a compra e venda, no procedimento comum ou no procedimento monitório,
porque a regra, tanto no direito brasileiro quanto no direito italiano, é a de que os livros comerciais
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fazem prova no litígio entre comerciantes.
Na verdade, o extrato contábil, justamente porque não prova o fato constitutivo do direito de
crédito, não é prova suficiente para a tutela da evidência (no procedimento monitório ou no
procedimento comum) nem para a procedência do pedido no procedimento comum ou para a
improcedência dos embargos à ação monitória. 61