Page 27 - TUTELA DE URGÊNCIA E TUTELA DA EVIDÊNCIA, Luiz Guilherme Marinoni, Ed. RT, 2017
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contra a probabilidade do dano. Porém, imaginou-se que a tutela de remoção seria voltada contra a
probabilidade de dano. Ou seja, a própria tutela de remoção foi desconfigurada para, a partir desta
transformação, admitir-se o emprego do procedimento cautelar.
Do mesmo modo que o procedimento da tutela inibitória assumiu característica autônoma, o
procedimento que passou a servir para a prestação da tutela de remoção igualmente dispensou a
chamada “ação principal”. A necessidade de tutela de remoção – assim como de tutela inibitória –
levaram à utilização e à distorção da técnica processual idealizada para a tutela cautelar. As tutelas
inibitória e de remoção, por serem satisfativas, não são instrumentais como a tutela cautelar, o que,
por mera consequência lógica, fez com que o procedimento dotado de liminar e meios executivos
idôneos adquirisse autonomia, dispensando o procedimento de conhecimento, o qual apenas teria
sentido caso houvesse necessidade de outra tutela jurisdicional do direito, que então seria assegurada
pela tutela cautelar.
Além do mais, é preciso advertir que a necessidade da obtenção da tutela do direito de modo mais
célere também levou à utilização da técnica cautelar como meio de sumarização do próprio processo de
conhecimento. É importante destacar interessante acórdão do Tribunal Superior do Trabalho que,
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julgando recurso ordinário em mandado de segurança, manteve decisão do Tribunal Regional do
Trabalho da 9.ª Região que havia denegado mandado de segurança que objetivava cassar liminar –
deferida inaudita altera parte em ação cautelar inominada – para reintegrar dirigente sindical nas
suas funções. O Tribunal Superior do Trabalho, na ocasião, assim argumentou: “É bem verdade que o
deferimento de liminar, assegurando a satisfação do direito material pleiteado, como, no caso, a
reintegração, não se coadunaria com a natureza instrumental e provisória do processo cautelar.
Entretanto, essa natureza jurídica da ação cautelar não pode subsistir em face do provimento de
maior envergadura previsto na Constituição Federal, norma hierarquicamente superior. Com efeito, a
dispensa de empregado, portador de estabilidade provisória, sem o competente inquérito
administrativo faz letra morta a garantia constitucional ínsita no art. 8.º, inciso VIII, da Lei Maior e, em
se tratando de dirigente sindical, impede, ainda, que o trabalhador exerça as funções para as quais foi
eleito, beneficiando a empresa em detrimento de toda uma categoria profissional. O MM. Juiz da JCJ de
Ponta Grossa, ao constatar que o empregado juntou documentação comprobatória de representação
sindical, deferiu a liminar, adotando o entendimento de que ‘é preferível rejeitar-se uma teoria
(rectius: uma tutela) que não atende à realidade social, principalmente no caso concreto, onde a
suspensão dos salários implica em possível supressão dos meios de sobrevivência e a posterior
reintegração implicaria pagamento de salário sem a prestação laboral’. Conceder, pois, a segurança
impetrada pela empregadora, cassando a liminar e, consequentemente, anulando a reintegração
efetivada, significaria premiar a empregadora, que, desrespeitando norma constitucional, foi a única
causadora de toda a situação. Assim, frente à hierarquia da imperatividade ínsita no dispositivo da
Carta Magna, que foi friamente desrespeitado pela ora impetrante, deve ser mantido o empregado no
exercício pleno de suas funções, até que a empregadora, se porventura sair vencedora do competente
inquérito, possa despedir legalmente o dirigente sindical.” 22
Esse julgado deixa evidenciada a deformação da técnica cautelar e, mais do que isto, a própria
necessidade desta transformação em nome da efetividade da tutela dos direitos. Realmente, as
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necessidades de direito substancial impuseram a distorção da técnica cautelar para a obtenção da
tutela satisfativa de modo antecipado. Mas não há como pensar que a prestação da tutela antecipada
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sob o manto protetor da técnica cautelar constituiu um abuso, uma vez que tal forma de tutela se
mostrou imprescindível à efetiva proteção do direito material e, assim, legítima à luz do direito
fundamental de ação.
1.4. A superação da regra da nulla esecutio sine titulo e o escopo de tutela dos direitos