Page 83 - TUTELA DE URGÊNCIA E TUTELA DA EVIDÊNCIA, Luiz Guilherme Marinoni, Ed. RT, 2017
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locais em que a sua própria razão recomenda. De outra maneira os direitos ficarão desprovidos de
tutela e, assim, o ordenamento jurídico, exatamente na parte que consagra direitos invioláveis e
fundamentais, assumirá a configuração de mera retórica e, dessa forma, sequer merecerá ser
chamado de “jurídico”. 191
Os artigos 297 e 536 do Código de Processo Civil afirmam que o juiz pode determinar as medidas
adequadas e necessárias à efetivação da tutela. Como tais normas configuram verdadeiras cláusulas
gerais executivas, destinadas a dar ao juiz poder para a determinação da modalidade executiva
adequada ao caso concreto, não há como lhe negar a possibilidade de ordenar sob pena de prisão. A
prisão, nesse caso, é apenas um meio de efetivação das decisões do juiz civil e não um meio destinado
a castigar alguém por um crime ou a compelir ao cumprimento de dívida pecuniária.
No caso em que se ordena um fazer cuja observância depende apenas do comportamento do réu e,
além disso, não exige o dispêndio de patrimônio, o juiz pode ordenar o cumprimento – obviamente
que dando para tanto prazo suficiente – sob pena de prisão. O demandado deve ter a oportunidade de
justificar a eventual impossibilidade do cumprimento. Escoado o prazo sem manifestação ou rejeitada
a justificativa, o juiz deve determinar a expedição do mandado de prisão. O tempo da prisão, no caso
em que se pretende um fazer, deve servir para vencer a resistência do réu, embora deva ter um limite.
Ordenado um não-fazer sob pena de prisão, ao demandado obviamente também deve ser conferida
oportunidade para falar. Nesse caso, a ameaça não está na prisão em si, mas sim na possibilidade da
sua ocorrência. Por isso, alguém poderia pensar que a execução dessa prisão tem caráter penal.
Acontece que o fato de a prisão poder apresentar uma face preventiva e outra repressiva nada tem a
ver com a sua natureza civil ou penal. A prisão civil, compreendida como meio de coerção indireta,
serve para constranger a parte a cumprir as decisões do juiz. De modo que pode assumir a
configuração de ameaça e de sanção privativa de liberdade.
Lembre-se de que exatamente o mesmo acontece com a multa civil, pois ainda que a ordem de não-
fazer sob pena de multa tenha nítida função intimidatória, a sua natureza é modificada quando a
ordem não é observada e é praticado o fazer que se desejava impedir. De coerção indireta a multa é
transformada em mera sanção pecuniária, embora não passe pela cabeça de ninguém que a multa
assumiu natureza penal. A dupla feição da multa deriva da simples circunstância de que a ameaça que
não é concretizada perde o seu valor. A multa tem que ser cobrada para que a sua função
intimidatória seja conservada.
O juiz, ao ordenar um fazer ou um não-fazer sob pena de prisão, deve fixar o seu prazo. O fato de
tal prazo poder ser estabelecido pelo juiz decorre da própria natureza de meio executivo da prisão. Se
a prisão, aqui, é um mero meio de execução das decisões do juiz civil, resulta natural que o seu prazo
deve se amoldar aos casos concretos, do mesmo modo que acontece em relação à multa, cujo valor
pode variar conforme o caso. Isso não quer dizer, como é óbvio, que não exista como controlar a
racionalidade da fixação de tais prazos pelo juiz.
Lembre-se de que a prisão apenas pode ser usada quando a decisão não exigir dispêndio de
dinheiro e depender do exclusivo comportamento da parte. Além disso, somente pode ser utilizada
quando nenhum outro meio de execução se mostrar capaz de dar efetividade à decisão judicial.
Porém, tudo isso deve ser perfeitamente demonstrado na motivação da decisão judicial. Como a prisão
civil é um meio executivo, e esse não pode se desprender do caso concreto, é a motivação que viabiliza o
controle da decisão judicial.
Por último, importa justificar o uso da prisão diante da tutela urgente. Cabe lembrar que a multa,
apesar de ter o objetivo de forçar o cumprimento das decisões judiciais, tem o seu montante voltado à