Page 105 - CURSO COMPLETO DE DIREITO AGRÁRIO, Silvia C. B. Opitz e Oswaldo Opitz, Ed. Saraiva, 7ª ed., 2013
P. 105
CURSO COMPLETO DE DIREITO AGRÁRIO, Silvia C. B. Opitz e Oswaldo Opitz, Ed. Saraiva, 7ª ed., 2013
judicialmente o usucapião especial, quando já casado, mas comprova que os requi-
sitos necessários ao mesmo já estavam preenchidos, antes do casamento. Não vemos
obstáculo ao seu deferimento, pois achamos que, aí, o imóvel usucapido não se
comunicará ao consorte do usucapiente, ante a regra contida no art. 272 do Código
Civil: 'São incomunicáveis os bens cuja aquisição tiver por título uma causa ante-
rior ao casamento'. E já vimos que a aquisição do domínio pelo usucapiente se dá
não em virtude da sentença, mas resulta da convergência dos elementos exigidos
para o usucapião, limitando-se a decisão judicial apenas à declaração de um direi-
to preexistente" (Usucapião de imóveis, cit., p. 41-2).
3. "Possuir como sua". Sentido da expressão na lei. Ocupação e
posse. Animus domini. Doutrina brasileira
"Possuir como sua" é outra exigência da legislação. Essa expressão correspon-
de a "ocupar", da Constituição de 1934, da de 1937, da de 1946 e do art. 98 do ET.
A expressão foi tirada do art. 550 do CC/16, que dizia: "Aquele que ... possuir
como seu ... ". É da tradição do direito brasileiro esta expressão, no mesmo sentido
dado nas Constituições referidas à palavra "ocupar".
Vejamos como se posicionou a doutrina a esse respeito. O CC adotou a teoria
de Ihering, em que a posse é a exteriorização do direito sobre a propriedade. O
animus e o corpus não são ideias distintas, porém dois aspectos da mesma relação
(cf. Jorge Americano, in Tese, 1926).
Para Lafayette, a "posse consiste no poder de dispor fisicamente de uma coisa,
com a intenção de dono, e de defendê-la contra as agressões de terceiros". Clóvis,
comentando o art. 550 (CC/16), diz: "As condições que o Código exige são a con-
tinuidade e a tranquilidade (objetiva) e o animo domini (subjetiva)". Depois ressal-
ta o ponto em exame e constante do art. 1º da Lei n. 6.969/81 e do art. 550 (CC),
que no usucapião o que "domina é o fato da posse contínua e incontestada, unida
à intenção de ter o possuidor o imóvel como próprio".
Carvalho Santos segue a trilha de Clóvis, e dá como requisito do usucapião o
animus domini, isto é, "que tenha a coisa como sua" (Código Civil brasileiro in-
terpretado, v. 7, p. 428, com. ao art. 550). Vejamos agora o que nos diz o mestre
Pontes de Miranda, a respeito dessa expressão "possuir como sua", adotada no CC
e no art. 191 em estudo. Diz ele:
"Não se deve entender a posse própria como posse de quem é proprietário,
porque o conceito de propriedade já é jurídico; não há, no mundo fáctico, pro-
prietários e não proprietários. Por isso, sem ser dono, se pode possuir a coisa
'como sua' (art. 550, verbis: 'possuir como seu o imóvel', e art. 618, verbis:
'possuir como sua'). O ser como seu ou como sua é conceito do mundo fáctico.
Daí o erro em se introduzir, ao falar-se de posse própria, referência ao animus
domini, o que importa em descida ao foro íntimo e em entrada no mundo jurídi-
co. O ser como dono, ou como quem só usa, ou usufrui, ou se serve de alguma
coisa, que se possui, passa-se ao mundo fáctico, e tão só no mundo fáctico. Qual-
quer alusão à própria consciência do exercício do poder fáctico é contra a teoria
possessória do Código Civil" (Tratado de direito privado, cit., Borsoi, 1955, v.
10, p. 137, § 1.079).
103