Page 287 - CURSO COMPLETO DE DIREITO AGRÁRIO, Silvia C. B. Opitz e Oswaldo Opitz, Ed. Saraiva, 7ª ed., 2013
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CURSO COMPLETO DE DIREITO AGRÁRIO, Silvia C. B. Opitz e Oswaldo Opitz, Ed. Saraiva, 7ª ed., 2013
propriedade privada da terra. Apesar de viger há quase 40 anos o ET, a pressão tem
sido maior por parte daqueles que querem ver concretizada essa grande esperança,
consubstanciada neste Estatuto. A Nação inteira vem assistindo a debates livres e
decididos sobre os problemas relacionados com o aperfeiçoamento dos processos
de exploração da terra e com a disposição de assegurar-lhe maiores índices de
produtividade e garantir o estabelecimento de condições propiciadoras da elevação
dos níveis de vida do povo. A reforma agrária tem sido objeto de congressos, em
várias regiões do País, com a finalidade de tornar uma realidade a aplicação do ET.
Essa instabilidade na aplicação da lei faz com que os contratantes se compor-
tem da mesma forma, preocupando-se em tirar vantagens maiores do que aquelas
permitidas no ET. Esquecem até a boa-fé, que sempre orientou todo o negócio
jurídico do passado, baseada na regra moral que disciplinou todas as transações da
vida econômica. O número elevado de julgados demonstra como as leis são viola-
das, imperando a má-fé, com as consequências desastrosas que daí advêm. Para
alcançar a gama dessas maquinações, deve o juiz deixar o seu gabinete e conviver
com o povo, para aprender com ele a linguagem modificada e usada nas transações,
a fim de que possa, no seu veredicto, interpretá-las. Deve saber como sente e fala
o homem vulgar e o homem culto, no dizer de Borgen. Na aplicação do ET, deve
compreender os usos e costumes dos colonos e pecuaristas, para poder interpretar
as cláusulas contratuais e ver se não violam as normas coercitivas daquele repertó-
rio legal. É uma lei de cunho publicista. O juiz deve-se preparar para isso, sob pena
de fracassar o ET.
A lei procura alcançar tudo o que possa impedir sua normal aplicação, a ponto
de mandar aplicar o CC, quando não tiver sido clara a respeito de algum princípio
fundamental, de que deveria tratar, mas não tratou. Daí compreender, nessa válvula
de escape, também os princípios gerais de direito comum, que se referem aos vícios
da manifestação da vontade, que possam ferir o livre trânsito dos contratos agrários.
Necessário se torna, por isso, o exame das regras fundamentais daqueles, para que
se possa deduzir da legalidade ou não do negócio jurídico querido pelas partes. Há
vícios que atacam de tal modo a manifestação da vontade (ou o acordo de vontade
e seu objeto) que impedem o agente de dar seu consentimento ou, se o faz, exprime-
-o de modo diverso do que pretendia ou desejava. A lei atual não esqueceu isso,
destacando principalmente a simulação e a fraude nos contratos de arrendamento
ou de parceria, nos arts. 92, § 7Q, da Lei n. 4.504/64, e 19, parte final, do Decreto n.
59.566/66, dizendo" ... ou fique comprovada qualquer outra modalidade de simu-
lação ou fraude por parte do arrendador" ou do parceiro-outorgante. Daí a impor-
tância do estudo desses vícios, para bem compreender e aplicar as normas legais. E
deve ele ser feito na parte geral, porque abrange todos os contratos agrários.
O princípio da boa-fé diz respeito, especialmente, a todas aquelas garantias
que, antes de fechar o contrato, se dão para levar a outra parte a contratar; porque,
também, estas fazem parte do conteúdo do contrato e são, por conseguinte, objeto
de interpretação. Aquele a quem são dadas pode exigir que o contrato se execute
de acordo com elas e não necessita, para se desligar em absoluto da obrigação,
impugnar o contrato, por erro ou fraude. Toda gente sabe, pela sua experiência de
vida, que antes de fechar o contrato sinalagmático, a parte que tem interesse em ce-
lebrá-lo apresenta tudo cor-de-rosa (principalmente na parceria rural, em que o
proprietário dá qualidades à terra, que muitas vezes ela não tem), passando, por
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