Page 320 - CURSO COMPLETO DE DIREITO AGRÁRIO, Silvia C. B. Opitz e Oswaldo Opitz, Ed. Saraiva, 7ª ed., 2013
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CURSO COMPLETO DE DIREITO AGRÁRIO, Silvia C. B. Opitz e Oswaldo Opitz, Ed. Saraiva, 7ª ed., 2013
35. Art. 46 do Regulamento. Sua constitucionalidade. Direito
francês. Decisão do STF. RE 86.400. Solução da espécie
"Art. 46. Se o imóvel rural em venda estiver sendo explorada por mais de um
arrendatário, o direito de preempção só poderá ser exercido para aquisição total
da área.
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"§ 1 O proprietário de imóvel rural arrendado não está obrigado a vender
parcela ou parcelas arrendadas, se estas não abrangerem a totalidade da área.
"§ 2 Nos casos deste artigo, fica assegurado a qualquer dos arrendatários, se
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os outros não usarem do direito de preempção, adquirir para si um imóvel."
A regra do art. 46 do Decreto n. 59.566/66 não é novidade em nosso direito,
dado que, sobre a matéria de que ele trata, dispunha o art. 1.154 do CC/16:
"Quando o direito de preempção for estipulado a favor de dois ou mais indivídu-
os em comum, só poderá ser exercido em relação à coisa no seu todo" (CC/02,
art. 517). Outra coisa não dispõe o art. 46 do Regulamento, ao disciplinar a forma
de exercício do direito de preferência, no caso da existência de um ou mais arren-
datário do imóvel arrendado. Assim procedendo, o regulamento não restringiu nem
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ampliou a regra do ET (art. 92, § 3 ). Pelo contrário, explicitou, onde havia impli-
citamente se estabelecido o direito subjetivo à aquisição preferencial do arrendatá-
rio. Mesmo que se discutisse a validade do art. 46 do Regulamento, em relação ao
ET, deveria a decisão resolver a questão pelo art. 1.154 do CC/16, por força do art.
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92, § 9 , da Lei n. 4.504/64 (ET), que manda, "para a solução dos casos omissos
na presente lei, prevalecer o disposto no Código Civil". Posta de lado a norma do
art. 46, referido, a decisão deveria afrontar a regra do art. 1.154 do CC para resol-
ver a questão objeto de exame, mas nunca proceder como procedeu, dando inter-
pretação ampliativa de norma que não admite senão interpretação restritiva, por
força da garantia constitucional ao direito de propriedade. Limitou-o fora da regra
constitucional, obrigando o proprietário a vender parte de seu imóvel ao arrenda-
tário, contra sua vontade e contra as normas legais. O atual CC mantém a mesma
regra em seu art. 517.
O Regulamento está certo. Sua função não é copiar a lei, mas cumpri-la, pre-
enchendo os claros deixados por ela, principalmente sob o aspecto formal, que é o
caso em debate. Foi o que aconteceu no art. 46 do Regulamento, que explicitou, tal
qual o art. 1.154 do CC/16, a forma de exercício da preferência, no caso de exis-
tência de mais de um titular a ele, estabelecido implicitamente no art. 92, § 3 , do
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ET. O regulamento apenas diz a forma como se deve proceder no caso do art. 92
referido. Ficou inteiramente subordinado à Lei n. 4.504/64, quando reconhece o
direito da preempção ao arrendatário e lhe completa a forma de exercê-lo, confor-
me ali se reconhece. Não há abuso de poder regulamentar nem invasão da compe-
tência do Poder Legislativo, porque a própria Lei n. 4.504 delegou ao Poder Exe-
cutivo regulamentar as formas de extinção do arrendamento (art. 95, IX, d), e entre
elas está a venda do imóvel arrendado, ou a sua aquisição pelo arrendatário (Regu-
lamento, art. 26, 111). A preferência é uma forma de aquisição, portanto de extinção
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do arrendamento. Logo, a norma do art. 46 não violou a regra do art. 92, § 3 , do
ET. Nem exorbitou, quando regulamentou a forma de exercício do direito de pre-
ferência do arrendatário. Complementou aquela regra o Regulamento, como bem
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