Page 356 - CURSO COMPLETO DE DIREITO AGRÁRIO, Silvia C. B. Opitz e Oswaldo Opitz, Ed. Saraiva, 7ª ed., 2013
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CURSO COMPLETO DE DIREITO AGRÁRIO, Silvia C. B. Opitz e Oswaldo Opitz, Ed. Saraiva, 7ª ed., 2013
promoverá discriminação das áreas ocupadas por posseiros, para a progressiva
regularização de suas condições de uso e posse da terra, providenciando, nos casos
e condições previstos nesta lei, a emissão dos títulos de domínio". A finalidade do
ET é manter o trabalhador rural na posse da terra que detém, daí o alcance da regra
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referida (art. 92, § 8 , 2ª parte).
67. Art. 93 do ET
Já vimos que o contrato de arrendamento e de parceria é bilateral e oneroso, o
que não ocorre em todos os contratos agrários; portanto, o contrato que não tiver
aquelas características é nulo, menos os previstos no art. 93 da Lei n. 4.504/64. A
forma do pagamento do preço do arrendamento ou parceria pode ser em natura ou
em dinheiro, no todo ou em parte. Por isso, ao proprietário é vedado exigir do ar-
rendatário ou parceiro-outorgado a prestação de serviço gratuito. Qual a razão e
origem dessa proibição? A medida visa evitar a exploração do arrendatário ou
parceiro-outorgado pelo arrendador ou parceiro-outorgante, impedindo que se
tomem servos da gleba.
A pergunta pode ser respondida com as palavras de Ruy Cime Lima, na se-
guinte passagem de seu trabalho sobre a propriedade e sua distribuição, onde diz:
"Salvas as iniciativas de justiça, com que o discernimento individual e o espírito
cristão dos empregadores a humanizaram, a condição do trabalhador rural, no
sistema econômico vigente, é, entre nós, a mais poderosa força, a promover a
transformação deste. Certo, a condição do trabalhador urbano, na legislação bra-
sileira de hoje, denota, ainda, vestígios da disciplina jurídica da servidão romana.
O intuito de coibir as inquietações sociais decorrentes do crescente número de
escravos, abandonados à própria sorte, que inspirou a Lei Aelia Sentia a exigir, ao
senhor menor de vinte anos, para liberar o escravo, menor de trinta anos, uma
justa causa manumissionis, esse mesmo intuito inspira, hoje, a exigência de uma
justa causa para a despedida do trabalhador assalariado. Mas, o trabalhador rural
é, segundo o Código Civil Brasileiro, não obstante a garantia da liberdade pesso-
al (art. 1.120), um servo da gleba. O empregador é obrigado a dar-lhe 'atestado de
que o contrato está findo' (CC, art. 1 .230), sem o que qualquer outro interessado
se exporá, tomando o trabalhador a seu serviço, à aplicação de pena civil, por
aliciamento de trabalho agrícola (CC, art. 1.235). Se o trabalhador se encontrar
em débito para com o empregador, que aquele vier a ter, ficará 'responsável pelo
devido pagamento' (CC, art. 1.230, III). Trata-se de uma odiosa servidão obriga-
cional que, posto desconhecida na 'campanha' riograndense, nem por isso deixa
de ser aflitivamente degradante como instituição jurídica. 'Sobra direta da escra-
vidão', à sua vez, é o cambão, ainda em pleno vigor no Nordeste. Denomina-se
cambão o contrato hoje inominado, pelo qual o proprietário presta o uso de uma
fração de terra ao cultivador, mediante a contraprestação de um ou mais dias de
trabalho, por mês ou por semana, a que este último fica obrigado, mas em área
diferente da de que recebe o uso. Subsiste, consuetudinariamente, no cambão, a
antiga figura dos serviços pessoais abolidos em Portugal na primeira metade do
século XIX e, segundo Teixeira de Freitas, nunca admitidos no Brasil, 'para que
tivéssemos necessidade de os abolir'. No Rio Grande do Sul diversamente, a con-
dição do trabalhador rural, quanto às áreas pastoris, é sinalada pelo coletivismo
indiferenciado do 'galpão', habitação comunitária dos empregados ou 'agregados',
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