Page 388 - CURSO COMPLETO DE DIREITO AGRÁRIO, Silvia C. B. Opitz e Oswaldo Opitz, Ed. Saraiva, 7ª ed., 2013
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CURSO COMPLETO DE DIREITO AGRÁRIO, Silvia C. B. Opitz e Oswaldo Opitz, Ed. Saraiva, 7ª ed., 2013
4. Arrendamento e comodato
Não se pode esquecer que o empréstimo teve a mesma origem do arrendamento,
como tantos outros contratos agrários, no direito romano. Mas mesmo assim, não há
entre eles um paralelo exato. Os documentos deixam ver no empréstimo (comodato)
uma modalidade formal de locação sendo que naquele o cultivador pedia uma pro-
priedade rural para explorar e o dono que cedia, em troca, estabelecia certas condições
lucrativas, que não o aluguel, naturalmente (cf. Juan Beneyto Perez, Estudios sobre
la historia dei régimen agrario, p. 175). Ambos- arrendamento e empréstimo
-podiam ser hereditários (v. com. ao art. 26, parágrafo único, do Regulamento).
Sob o aspecto econômico, evidencia-se logo a diferença. O arrendamento é um
contrato com o fim de renda. Ninguém arrenda um prédio rural, sem visar lucros.
Nenhum negócio ou empreendimento é feito, economicamente, sem o objetivo de
maior rendimento. O empresário rural é sempre um homem à cata de lucros. Numa
empresa capitalista, é o lucro que impulsiona a máquina da produção e faz com que
os homens se organizem para a exploração da terra, e no ET isso é destacado quan-
do se definem as organizações que visam a exploração da propriedade rural (ET,
art. 4Q). É o lucro visado por essas organizações que exige leis especiais em sua
proteção, muitas vezes, até, por interesse público, para se coibirem os abusos. O
proprietário também é um capitalista que arrenda o imóvel rural de seu domínio,
visando a maior renda, com o objetivo de ver compensado, economicamente, seu
capital, e, desde o momento em que o lucro não corresponde àquele, procura, por
todos os meios, desfazer-se do arrendatário. Este objetivo diferencia o comodato
do arrendamento. O comodato é a entrega gratuita de um imóvel rural ao comoda-
tário, ao passo que, no arrendamento, fica o arrendador obrigado a garantir a posse
mansa e pacífica do imóvel, bom como mantê-lo em condições de uso pelo arren-
datário. Este, por sua vez, tem de pagar os locativos no prazo estabelecido, sob pena
de despejo, mesmo que ocorra malogro da colheita (Regulamento, art. 32, 111). Cabe
ao arrendatário cumprir à risca o contrato, a fim de evitar sua rescisão (ET, art. 92,
§ 5Q, e Regulamento, art. 32, IX). Deve conservar o imóvel como se seu fosse. O
comodatário não pode dar em arrendamento, porque não tem a disponibilidade do
imóvel, ao passo que o arrendatário pode, desde que consinta expressamente o
proprietário (ET, art. 95, VI, e Regulamento, art. 31).
Afora a gratuidade, ambos os contratos se assemelham e têm muita afinidade.
Se, no contrato, as partes denominam arrendamento, porém de suas cláusulas se
deduz que se trata de comodato, este deve prevalecer, não só pela falta de preço do
arrendamento, como também por ser esta a intenção das partes. Se tal ocorrer, mes-
mo que o empréstimo seja por tempo certo, não pode o comodatário usar do direito
de prorrogação. Nada impede, no entanto, a transformação de um contrato por outro.
Quando isso se der, deve o arrendamento preencher os requisitos legais (Regula-
mento, art. 12). Se o contrato for de comodato, ao comodante cabe a ação de rein-
tegração de posse, por não existir em nosso direito ação de comodato, no caso em
que o comodatário se recuse a entregar o imóvel rural no tempo devido. Não incide,
portanto, a norma do art. 32 do Regulamento ao ET, salvo se tomar a forma de um
contrato agrário, na forma do Regulamento. Se o contrato for de arrendamento, cabe
ao arrendador usar de ação de despejo prevista neste art. 32, com o rito do art. 275,
11, a, do CPC, sendo-lhe vedado retomá-lo fora dos casos ali previstos.
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