Page 68 - CURSO COMPLETO DE DIREITO AGRÁRIO, Silvia C. B. Opitz e Oswaldo Opitz, Ed. Saraiva, 7ª ed., 2013
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CURSO COMPLETO DE DIREITO AGRÁRIO, Silvia C. B. Opitz e Oswaldo Opitz, Ed. Saraiva, 7ª ed., 2013
Nas remotas raças latinas vamos encontrar no herctum a primitiva proprieda-
de familiar que consistia "no espaço bastante extenso no qual a farm1ia tem a sua
casa, os seus rebanhos, o pequeno campo que cultiva" ( cf. Fustel de Coulanges,
Cidade antiga, cit., p. 91). Compare-se esse sentido de propriedade familiar com
o moderno adotado pelo art. 4º, li, e ter-se-á a explicação de tão remoto instituto
de direito agrário.
Ligada à propriedade familiar estava sua extensão, que não era arbitrária, dado
que devia servir à manutenção da família em toda sua amplitude, ou seja, garantir-
-lhe a subsistência e o culto doméstico aos antepassados. Essa extensão variou no
tempo e corresponde ao que hoje chamamos "módulo rural", que é a área fixada
na qual a família tem sua casa, seus rebanhos e o pequeno terreno que cultiva.
No direito romano, em que toda a propriedade emanava originariamente do
Estado, o imóvel rural não era dado em propriedade individual. Embora essa fosse
a regra, verificavam-se exceções, como as dos prédios itálicos que foram dados
pelo Estado a particulares. A quantidade de terra que formava essa propriedade
particular era muito pequena e atingia apenas dois arpantes, o que mal dava para
a casa e seu jardim (era um minifúndio). Ao lado dessa propriedade permitia-se que
o pater familiae gozasse do domínio das terras públicas em extensão, que variava
com cada conquista. Os plebeus auferiam maior área, chegando até a sete arpantes,
enquanto os patrícios recebiam apenas dois. Somente muito mais tarde surgiram
concessões maiores de terras públicas a homens poderosos, embora pudessem ser
revogadas ad libitum pela República.
Contra isso travou-se uma luta constante por meio das chamadas leis agrárias,
em que sempre se procura fixar o módulo permitido para cada um. Assim, temos a
Lex Sempronia Agraria, de Tibério Graco, que se dirigiu contra as possessões e
limitava-as ao tamanho de 500 jugeras (jugera - medida agrária correspondente
à porção de terra lavrada por uma junta de bois durante um dia e tem 240x 120 pés).
Mutatis mutandis, que outra coisa é o módulo rural? Seguia-se assim o exemplo da
Lei Licínia. Como medida de progresso social e econômico, concedia aquela lei
para cada filho da família mais 250 jugeras.
Embora se dirigisse contra os latifúndios, a lei não era iníqua, pois pela pri-
meira vez concedia uma indenização aos ocupantes pelas parcelas expropriadas.
Foi nessa lei que se esboçou um cadastramento das propriedades, pois havia uma
comissão de três membros encarregada, todos os anos, de separar o domínio públi-
co dos bens pertencentes aos particulares e de reivindicar, em nome do Estado, tudo
aquilo que ultrapassasse a medida prescrita.
Com a morte de Caio Graco, o excesso de regras da Lex Sempronia foi afasta-
do por três plebiscitos, de datas e conteúdos conhecidos de maneira incompleta e
algo sujeitos a controvérsia. O primeiro desses plebiscitos, de data posterior a 633-
121, derroga a proibição de alienação das terras doadas (consignadas) e permite
aos possuidores vendê-las. Esse plebiscito foi proposto por uma personagem igno-
rada, visto que seu nome não foi conservado.
O segundo plebiscito, de iniciativa de Spurius Thorius, que deu a Lex Thoria,
verificou-se em 633-119 ou em 636-118, conforme M. Monsen: proíbe a consig-
nação (consignatio) para o futuro e exonera os Triumviri agris dandis assignandis.
Confirma os velhos posseiros em suas posses, com a condição de pagarem um foro,
cujo montante seria repartido entre os cidadãos pobres.
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