Page 55 - LICENCIAMENTO E COMPENSAÇÃO AMBIENTAL NA LEI DO SISTEMA NACIONAL DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO (SNUC)
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38 Licenciamento e Compensação Ambiental na Lei do SNUC • Bechara
do poluidor-pagador de ser um “autorizador da poluição mediante pagamento”,
como se aquele que tivesse intenção de causar (ou de não impedir) degradação
ambiental pudesse oferecer uma quantia ao poder público para fazê-lo livremen-
te, sem reprimendas.
Mister esclarecer que, longe de constituir uma autorização de poluição para
aquele que pagar uma quantia, o princípio em tela impõe àquele que desenvolve
atividade com potencial poluidor o dever de “pagar para não poluir” ou de “pa-
gar porque, indevidamente, poluiu”. Não vislumbra este princípio, destarte, a
negociação de “cotas de poluição” para o agressor do ambiente. 85
Ainda que em situações excepcionais se venha a tolerar algumas ativida-
des geradoras de impactos ambientais, porque inevitáveis, a sua liberação pelo
Poder Público nunca estará arrimada no princípio do poluidor-pagador. Ou seja,
a licença ambiental, se concedida, não será justificada pelo compromisso do em-
preendedor de pagar um valor para tanto. A justificativa será outra. O órgão li-
cenciador levará em conta, para permitir a atividade, outros princípios e valores,
tais como a necessidade coletiva, a qualidade de vida e a dignidade da pessoa
humana, que serão, de certa forma, propiciadas pela atividade licenciada. Resul-
tado disso: o princípio do poluidor-pagador será, sim, invocado, mas não como
fundamento da autorização mas como consequência dela, já que os impactos
evitáveis terão que ser contidos às custas do empreendedor e os inevitáveis terão
que ser compensados previamente, conforme veremos no Capítulo 5.
Quanto aos efeitos da aplicação do princípio do poluidor-pagador sobre os
consumidores finais do produto ou serviço, é certo que eles, ao adquiri-los ou
contratá-los, acabarão pagando todo o custo da internalização das externalida-
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des ambientais (tanto mais diluído quanto maior o número de exemplares ou
atividades disponibilizados ao consumidor). Ainda assim, enxerga-se no princí-
pio uma medida de equidade, “uma vez que impõe custos apenas àqueles pro-
dutores ou consumidores que se beneficiaram ou optaram por produtos oriun-
dos de processos degradadores, isentando aqueles que não contribuíram para a
degradação”. 87
85 NALINI, José Renato. Ob. cit., p. 27.
86 Chris Wold observa que o setor produtivo questiona o princípio sob o argumento de que produz
de acordo com as preferências demonstradas pelos consumidores e que, por essa razão, não seria
correto que arcasse sozinho com os custos ambientais de sua colocação no mercado. Se a colocação
dos bens e serviços no mercado se dá para atender às demandas dos consumidores, eles deveriam
ser obrigados a arcar com uma parcela desse custo. Os Estados, contudo, relutam em repassar dire-
tamente tais custos aos consumidores, “o que não significa que estes não lhes serão indiretamente
transferidos por intermédio do processo de formação de preços. Com efeito, tendo em vista a forma
como o princípio do poluidor pagador é aplicado, observa-se ser possível a incorporação aos preços
de bens e serviços dos custos adicionais de prevenção, mitigação e compensação dos impactos ne-
gativos da atividade econômica” (ob. cit., p. 24).
87 Danny Monteiro da Silva. Ob. cit., p. 70.
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