Page 68 - LICENCIAMENTO E COMPENSAÇÃO AMBIENTAL NA LEI DO SISTEMA NACIONAL DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO (SNUC)
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Impacto, Poluição e Dano Ambiental sob a Ótica dos Princípios do Desenvolvimento Sustentável 51
ambiental ex ante, objeto deste trabalho), mesmo porque, apesar de autorizados,
não deixam de ferir o direito da coletividade à qualidade ambiental, i.e., não dei-
xam de causar um dano jurídico.
Assim, o ordenamento jurídico, por mais que autorize a atividade e por mais
que saiba que essa atividade provocará uma lesão ambiental, não aceita que a
vítima-coletividade “fique” com todo o ônus do prejuízo. Por isso, impõe ao res-
ponsável pela lesão o dever de arcar com a reparação.
Não nos deixemos enganar, portanto: o fato de o órgão licenciador antever
ou conhecer a lesão ambiental não significa que a deseje ou que a permita. Pode-
se ter a errônea impressão de que, se o órgão liberar uma atividade conhecendo
os danos que ela causará, é porque concorda com tais danos. Mas não. Ele con-
corda, isso sim, é com a atividade (e entenderemos o porquê nos tópicos 2.2.4 e
2.2.5), mas continua repudiando os danos dela decorrentes. Tanto é que, mesmo
autorizando o empreendimento, exige, desde logo, que os danos sejam reparados
– caso estivesse de acordo com os danos, por que determinaria a sua reparação?
2.2.3.1 Objeto e sujeito passivo do dano ambiental
Frise-se que, enquanto o meio ambiente é o objeto sobre o qual recai a condu-
ta lesiva, a vítima (leia-se: sujeito passivo) dos danos ambientais é a coletividade,
porque é ela a titular do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, de
acordo com o art. 225, caput, da CF. Quando o meio ambiente é agredido, com al-
teração de sua qualidade, a coletividade deixa de usufruir de um ambiente sadio,
necessário para a realização de vários outros direitos, como o direito à saúde, ao
bem-estar físico e psíquico, à identidade e memória histórico-cultural etc.
Por isso é que a lesão aos componentes ambientais, via de regra, resvala de
forma comprometedora na saúde e bem-estar físico e psíquico da coletividade.
Nada obstante, para ser considerado dano ambiental, não basta que constitua
uma lesão direta à saúde, bem-estar e outros valores humanos; é preciso, antes,
que a conduta afete os componentes ambientais e, ao afetar os componentes am-
bientais, lese o direito difuso ao meio ambiente sadio.
O português José de Sousa Cunhal Sendim, reiterando que dano é a lesão
a bem jurídico (protegido pelo direito), arremata que o bem jurídico, em caso
de dano ambiental, não é exatamente o componente ambiental mas o estado de
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qualidade (ou um estado-dever) que este componente do meio ambiente deve
126 Diz o autor que o atual direito português integra na noção de dano ao meio ambiente os bens
jurídicos ecológicos (estados ambientalmente adequados dos componentes naturais do patrimônio
natural) e bens culturais, como, por exemplo, a paisagem. Mas adverte: “tais bens, embora pudes-
sem ser considerados desde uma perspectiva unitária, são substancialmente diversos, quer no que
respeita ao seu objecto, quer no que toca à ratio da sua protecção. Desde o primeiro ângulo porque,
no caso dos bens jurídicos ecológicos, o objecto da protecção é o patrimônio natural, como conjunto
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