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Sandra M. G. Pinto FRAGMENTA HISTORICA
Ora, são precisamente os itens considerados Já as novas normas, que correspondem,
como mais antigos que se acham reproduzidos portanto, aos itens 2, 5 a 11, 19, 21 a 33, 36
no regulamento em estudo. Assim, e a 38, 40 a 48, dizem respeito, na sua grande
excetuando o título (§ 1) e o item 16 – relativo maioria, às regras jurídicas definidoras do
aos corretores – do códice do Archivo Real y juízo sobre obras . Mas, daqui não se pode
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General de Navarra, todos os outros, ou seja, inferir que, até então, os almotacés lisboetas
os itens 2, 3, 4, 5 e 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13 não estavam incumbidos destas matérias.
e 14, 15 correspondem, respetivamente, aos Conforme assinalou Magnus de Mello Pereira,
itens 1 e 3, 4, 12, 13, 14, 15, 16, 17 e 18, 20, 34, é o item 3 do códice do Archivo Real y General
35, 39 do foral da almotaçaria de Lisboa . A de Navarra – equivalente ao item 4 do foral da
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cópia das normas, de um diploma para o outro, almotaçaria de Lisboa –, debaixo da epígrafe
apresenta-se, pois, como uma evidência, já que “Das cousas que pertencem” , que resume
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nenhum texto normativo ostenta diferenças as competências próprias da instituição e
substanciais, apesar de existirem algumas que podem ser sintetizadas em três grandes
atualizações na grafia, no vocabulário ou domínios de controlo: a construção, a limpeza
nos tempos verbais. As principais diferenças urbana e o mercado . Aliás, destes três,
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deparam-se no rearranjo de meia dúzia de é o domínio da construção que surge com
normas, por divisão ou junção , e na adição muito maior detalhe, expondo os elementos
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pontual de palavras ou frases . Além disso, o construtivos e as ações que, com certeza,
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próprio facto da sucessão normativa se manter mais conflitos provocavam entre vizinhos.
intacta, ainda que interpolada por novas Ademais, aquele investigador notou ainda,
normas, concorre também para sustentar a que a colocação invertida do verbo nas frases
relação entre estes conjuntos normativos . do texto deste item permite pensar que ele
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deve ter sido escrito “originalmente em latim e
corresponder às eras de 1342 e 1340, mas na verdade
referem-se a 1362 (ano de 1324) e 1360 (ano de 1322). foi inserida no regulamento de Lisboa, as quais, por sua
De referir ainda que os itens deste códice não foram vez, diziam respeito apenas às atividades comerciais.
originalmente numerados, tendo sido acrescentadas De modo genérico, os temas tratados nessas normas
aquando da publicação, usando-se aqui essas cifras que são os seguintes: § 17 – pregoeiros; § 18 – rendeiros
iniciam a sua contagem no título (ver a primeira coluna da almotaçaria; §§ 19 a 31 – venda do pão e da farinha;
da tabela anexa). §§ 32 a 49 – venda de carne; §§ 50 a 58 – venda de
58 Ver a primeira e a terceira colunas da tabela anexa. vinho; § 59 – lagareiros; §§ 60 a 72 – barqueiros; §§
59 O § 2 e o § 10 do códice de Navarra deram origem, 73 e 74 – madeireiros; §§ 75 e 85 – tanoeiros; §§ 86
respetivamente, aos §§ 1 e 3, e, §§ 17 e 18 do foral da a 89 – ferreiros. Cf. Posturas do Concelho de Lisboa…,
almotaçaria de Lisboa. pp. 47-58.
60 Os §§ 5 e 6, e, §§ 13 e 14 do códice de Navarra deram 63 Além destas, que compreendem o maior número,
origem, respetivamente, ao § 13 e ao § 35 do foral da isto é, vinte e duas normas, fazem ainda parte: duas
almotaçaria de Lisboa. normas sobre o provimento dos oficiais; a norma
61 Ao foral da almotaçaria de Lisboa foi acrescentado acerca do alcance da instituição; duas normas relativas
no final do § 1 – “ssegundo a pustura do comçelho” aos tributos da instituição; seis normas processuais; e a
(referindo-se provavelmente ao documento de origem); norma sobre obras públicas.
no final do § 4 – “devem Julgar os almotaçees”; no meio 64 Cf. § 3, nas Posturas do Concelho de Lisboa…, p. 45
do § 14 – “E as do saal E as da cal”; no final do § 17 – “e (ver a primeira coluna da tabela anexa).
o vinho que for conprado fora da ujlla e o trouxerem a 65 Em Lisboa, estes três domínios da almotaçaria
villa pera o vender sse vier en tonees vendam no em foram no início do século XVI separados por alçadas
esses tones em que vyer E sse vier em trebolhas ou estabelecendo-se, por isso, três tipos de almotaçarias:
em odres nam no metam en tones ou em tinhalhas “execuções” (mercado), “limpeza” (limpeza urbana)
nem em all saluo em aquella mesma coussa em que e “propriedades” (construção). Sandra M. G. Pinto,
o adusserem em essa o vendam E aquelle que contra “A instituição da almotaçaria, o controlo da atividade
esto for esrrombar lhe am os tonees ou lhe britarom construtiva e as singularidades de Lisboa em finais
aquella mesma cousa em que ho teuer e verter lhe am da Idade Média”, in Lisboa Medieval: Gentes, Espaços
todo o vinho pollo chãao E peitara sasenta soldos”; e Poderes. Textos seleccionados do III Colóquio
a meio do § 20 – “obra”; no final do § 34 – “Justiça” Internacional “A Nova Lisboa Medieval” (Lisboa, FCSH-
(substituindo “custume”); a meio do § 35 – “sasenta e NOVA, 20-22 de Novembro de 2013), coord. João Luís
quatro” (substituindo “xiiij”). Fontes e Luís Filipe Oliveira, Lisboa, Instituto de Estudos
62 Nenhuma outra norma do restante códice de Navarra Medievais, 2016, pp. 287-312.
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